3 de dezembro de 2025

Afro sim africano não

Sou afro sim! africano não…

Vira e mexe encontro aí pela web gente “emocionada” falando em “povo preto” ou “povo negro”, “nosso povo”, ou pior, se colocando como “africano nascido fora da África”.

Discordo, e explico:
Primeiro por motivos semânticos e conceituais. Povo é sinônimo de grupo étnico, e etnia tem uma série de critérios técnicos antropológicos para ser considerada e identificada. Também não se confunde com a superada ideia de raça biológica, ou com a racialização social feita a partir do racialismo. Povo ou etnia são sinônimos do termo em desuso TRIBO. Não é o caso para os afrodiaspóricos.

Segundo porque eu não estou me baseando na opinião/ótica homogeneizante do colonizador… (que vê todos os pretos e negros como uma coisa só…) . Estou falando dos próprios africanos…. . Eles simplesmente não nos enxergam, nem aceitam como africanos… E qualquer afrodiaspórico que tenha vivido em África (como eu por exemplo…) sabe muito bem disso… .

Porém, muitos “neopanafricanistas” sem o choque de realidade no terreno, ainda olham para uma África mítica, como se ela não tivesse mudado desde o sequestro dos nossos antepassados, e como se nós afrodiaspóricos, também não tivéssemos “virado outra coisa” com os oceanos de distância, tempo e cultura que nos separaram.

Em África o que manda mesmo é ETNIA ( isto é, cultura, o que inclui a língua mãe, e noção de parentesco remoto), não a mera cor…. Nem mesmo as nacionalidades são absolutamente unificadoras.

Assim como os europeus e os asiáticos não se vêem como “um povo” (mas vários), bem como os indígenas das Américas, os africanos também não. Funciona assim, “Meu povo é quem fala minha língua-mãe (não a imposta pelo colonizador e suas fronteiras artificiais) e tem os mesmos costumes e tradições ancestrais”.

O afro-diaspórico não configura “povo” (etnia) mas apenas grupo amalgamado e racializado a partir da história comum no tráfico negreiro, escravidão e culturas negras desenvolvidas e vivências a partir dai.

África é uma referência ancestral sim, faz parte das nossas identidades negras, mas não pertencemos ao continente, quando muito nos ligamos por história, ancestralidade e cultura derivada.

Só consegue entender de fato e na alma a nossa identidade afrodiaspórica quem foi negro em África… .

Portanto, a reinvindicação de “africano fora da
África”, é tão irrealista quanto os catarinenses e sulistas que se acham “europeus”, “alemães” ou “italianos”… . Descendem, parecem, até podem ter passaporte, mas não o são de fato e nem mesmo são aceitos como tal pelos próprios europeus… . A ilusão só é desfeita quando tentam “retomar seu lugar”, lugar ao qual “pertencem”, mas na verdade só na cabeça deles… .

 

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