O meu movimento negro sou eu, ou, de novo a Glória Maria ?
Hoje a “bolha negra” da web tupiniquim amanheceu com mais uma “treta” relacionada a prestigiada repórter e apresentadora da poderosa rede Globo. Desta vez, uma fala em entrevista ao “Conversa com o Bial” em que mais uma vez questionada sobre “movimento negro” deu resposta que não agradou muito aos ativistas, militantes e simpatizantes de tais movimentos.
Não vou falar especificamente dessa entrevista, mas vou usar um trecho de outra entrevista, escrita, que saiu hoje . Nela temos “Costuma dizer que a televisão é um acidente de percurso. Mas não se arrepende de nada, tampouco de não ter levantado bandeiras em nome do movimento negro, embora já tenha sido cobrada por isso. ‘O meu movimento negro sou eu. Basta olhar para mim, sempre brigando, sempre correndo atrás’, diz. ‘Eu sou, literalmente, a ovelha negra do jornalismo.’ Glória Maria fala com a autoridade de quem teve de enfrentar o racismo em diversos momentos de sua carreira.”
Glória Maria em uma “vibe Luis XIV”, monarca francês famoso pela frase “O Estado sou eu”, uma “egotrip”, faz a sua própria ao dizer “O meu movimento negro sou eu”. Não é a primeira vez que “desdenha” ou critica os movimentos e ativistas, pelo menos no que diz respeito a ela própria.
Com meus 32 anos de ativismo negro, sei perfeitamente que ninguém, em nenhum recorte social, é “obrigado” a ser ativista ou militante pela causa, por simplesmente pertencer a um recorte. Aliás, ativistas são sempre pequena parte de cada recorte, os que lutam não apenas pelos próprios interesses, mas principalmente pelos da maioria inconsciente ou apática.
Eu mesmo não concordo com muitas coisas que vem de alguns ditos “militantes” ou “ativistas” equivocados, “lacrador@s”, principalmente os que costumo chamar de neoativistas. O que apesar de ter uma questão geracional, não limita os equivocados a uma ou outra geração, os há em todas.
O problema das recorrentes falas de Glória Maria é que, sendo ela quem é, ao “personalizar” a sua luta e desdenhar as demandas coletivizadas pelos movimentos, reforça a ideia metarracista de que “o que vale é apenas o ‘mérito pessoal’ “, que “cada um que lute” abrindo por si e apenas para si um caminho em meio a estrutura racista. O que no mínimo revela insensibilidade, inconsciência e egoísmo, além de efetivamente “dar munição” aos metarracistas que combatem as mudanças coletivizadas no Status Quo.
Já li que ela, Glória Maria, recorreu à Justiça por ter sido discriminada, será que foi o “movimento negro ela mesma” que lutou e conseguiu emplacar o racismo e a injúria racial como crime ?
Novamente repito, nem Pelé, nem Glória Maria, nem outra pessoa negra que tenha excepcionalmente rompido barreiras na estrutura racista, é “obrigada” a “levantar bandeiras”, mas deveria pelo menos ter o cuidado de não servir de “token” para o discurso da “democracia racial” e para o metarracismo, prejudicando a luta dos demais, que não ficam satisfeitos em ser bem sucedidas exceções… .
Que Glória Maria se recupere bem de todos os percalços pelos quais passou recentemente, e que siga sua trajetória de sucesso, mas que fique registrado que ela é da turma do “Me, Myself and I”… . Se não é um “Sérgio Camargo”, que é uma completa vergonha para a negritude brasileira, ao servir ativa e descaradamente ao metarracismo brazuca, também seu lugar na história não é ao lado dos que lutaram para além do próprio umbigo… .