5 de dezembro de 2024
Deu no Portal K3, logo após a notícia os nossos comentários…
” Câmara de Araraquara institui o Dia de Ogum
Cidade realiza este ano a quarta edição da festa em homenagem ao orixá
publicado em 17/04/2013 11:01 | Da Redação

Câmara institui o Dia de Ogum em Araraquara
Foto: Divulgação

A Câmara dos Vereadores de Araraquara aprovou por unanimidade o projeto que oficializa o 23 de abril como o Dia de Ogum no calendário municipal na votação realizada na terça-feira (16).
O projeto do vereador Roberval Fraiz atendia a um apelo dos praticantes das religiões de matriz africana da cidade.
A sanção será feita pelo prefeito Marcelo Barbieri no próximo domingo (210, quando a Federação Espírita de Umbanda e Candomblé do Estado de São Paulo (Fecumsol) realiza da 4ª Festa de Ogum, no Ginásio da Pista, a partir das 9 horas.
Durante a votação na Câmara, o presidente da Fecumsol, José Francisco Tomé dos Santos, usou a tribuna livre para explicar que a data lembra o dia em que São Jorge, ou Ogum no sincretismo religioso, foi degolado por ordem do imperador romano Deocleciano no ano 303. O guerreiro do Exército Romano se tornou um dos santos mais venerados no Catolicismo e é um dos orixás mais respeitados na Umbanda, responsável por guiar seus filhos de fé e abrir os caminhos mais difíceis. ”  (fonte : Portal K3 )  .

Pois bem, agora nossos comentários,  a uma primeira vista, muita gente vai dizer que isso é um “absurdo”, que o estado é laico e não deveria levar em consideração manifestações religiosas nem “favorecer” qualquer religião…; porém na prática não é o que ocorre, o estado brasileiro tem demonstrado em todos os níveis, que apesar de oficialmente laico, não é ateu…, muito menos imparcial com relação à religiosidade, basta ver em vários orgãos públicos a afixação por exemplo de crucifixos (símbolo da cristandade e muito em especial do catolicismo), a própria constituição em seu preâmbulo cita Deus…, o dinheiro possui a célebre inscrição “Deus seja Louvado” , algumas  casas legislativas tem no regimento interno que  sessões e audiências devem se iniciar com uma oração ou evocando a  benção e proteção divina para os trabalhos…, as forças armadas possuem em seu quadros e pagos com dinheiro público, oficiais capelães cujo objetivo é dar assistência e “conforto espiritual” à seus membros…, e por fim, basta observar os calendários oficiais tanto federal quanto estaduais e municipais para verificar o quanto estão recheados de feriados e dias comemorativos de cunho religioso… .

Sendo assim…, afinal ? o que é que “choca” na notícia e acontecimento ?, vos digo…, é o fato do poder público “desviar” o eixo do quase exclusivamente cristão/católico, para outras crenças… e principalmente para uma tão historicamente estigmatizada quanto a religiosidade afrobrasileira…, é isso que leva as pessoas a se chocarem e indignarem com uma situação que na realidade é muito comum porém sempre limitada à fé majoritária…

A Câmara de Araraquara erra ao fazer isso ?, os grupos afroreligiosos erram ao solicitar e fomentar essa “oficialização” de um dia de grande valor simbólico dentro de sua cultura/fé (mesmo que não majoritária) ???, a resposta é NÃO…, estão corretos e completamente de acordo com a legislação maior,  por exemplo a  LEI FEDERAL Nº 9.093, DE 12 DE SETEMBRO DE 1995. em seu Art. 2º diz ” São feriados religiosos os dias de guarda, declarados em lei municipal, de acordo com a tradição local e em número não superior a quatro, neste incluída a Sexta-Feira da Paixão.” , alguém mais afoito e menos informado poderia dizer que “Dia de Ogum” não é religioso  (ou mesmo toda manifestação das religiões afrobrasileiras “não são” religião, isso do seu ponto de vista etnocentrado e intolerante), ocorre que a Constituição abriga o direito a todos cultos e crenças, logo, se existe um coletivo cuja espiritualidade, crenças e práticas são comuns e seus membros assim o reconhecem enquanto prática e grupo religioso, não há diferença oficial entre esse e qualquer outro grupo religioso (mesmo que tradicional e majoritário), logo, tanto Ogum quanto o seu dia possuem significado religioso e se enquadram no escopo da lei.

Em uma segunda onda de reação, viria o argumento, ” Ah ! , mas apenas quatro feriados religiosos municipais são permitidos…, extrapolou, não pode ! ” , ocorre que no caso em questão, pelo menos pelo entendido da matéria, não se propôs feriado religioso e sim data comemorativa oficial, que são coisas diferentes… .

Apenas para concluir, a própria  LEI FEDERAL Nº 9.093 que regulamentou a questão dos feriados e datas comemorativas (civis e religiosos) se mostra passível de alteração visando maior elasticidade, pois não observou o disposto no artigo constitucional ao qual deveria ter dado detalhamento :

Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

§ 1º – O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.

§ 2º – A lei disporá sobre a fixação de datas comemorativas de alta significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais.

Pois é.., para quem não sabe, a religião está inserida dentro do que se chama CULTURA de um povo ou população, observado ainda que os demais valores não-religiosos mas significativos para as diversas “etnicidades” (afro-brasileira e indígena citados textualmente) também são contemplados,  nossa lei maior ampara completamente a questão (e outras como por exemplo a transformação do dia do Ìndio e da Consciência Negra em feriado…), mas a lei infraconstitucional parece não ter dado “muita bola” para isso…, ainda reflete (veladamente) a ideia de que atendidas as maiorias, o que vier das minorias “extrapola” o razoável… . (e ainda tem gente que “não entende” o motivo de existirem movimentos de minorias que apenas lutam para fazer valer direitos naturais e/ou legalmente definidos, que apesar de existentes (e comuns para as maiorias) continuam a ser solenemente ignorados e/ou rechaçados  quando se trata de dar tratamento igualitário às minorias ) .

E por falar nisso…,  OGUM NHÊ ! (saudação em yorubá  para o Orixá Ogum).

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