Ainda sobre a questão da imigração haitiana
A polêmica e a discussão acalorada do tema (pelo menos aqui pela Amazônia e especialmente no Amazonas) não dão sinais de arrefecimento, fatos novos e um número crescente de manifestações diversas na imprensa e nas redes sociais continuam e continuarão alimentando o debate e trazendo à luz da questão, novos e “requentados” prismas .
Depois de N manifestações preconceituosas e discriminatórias mais ou menos veladas (culminadas com o incendiário e nada velado artigo da colunista Mazé Mourão (se ainda não está a par da questão leia aqui meu artigo anterior) ), vieram as reações e contra-reações (muitas também questionáveis, mesmo quando aparentemente anti-discriminatórias).
Como não poderia deixar de ser na nossa meta-racista sociedade, a tentativa e “propostas” de retirar o foco da questão racial embutida no ” imbróglio” tem aparecido recorrentemente , sendo o rebate desse viés específico o motivo do post atual.
O brasileiro “não-negro” possui o tradicional costume de tentar camuflar a sua mentalidade e práticas racistas, remetendo tudo para a “questão social”…; ela existe sim, mas no caso brasileiro nunca se dissocia completamente da questão racial, é uma variável real e indispensável tanto para a análise do nosso contexto histórico-social passado quanto presente e expectativas futuras.
A imigração maçica de europeus (e depois japoneses) no final do séc. XIX e por todo século XX, mais do que inserir mão de obra qualificada para a era industrial e substituição da mão-de-obra escrava na lavoura ( e não sei o “porque” de tamanha necessidade de “substituição”, já que os ex-escravos nem haviam se “extinguido” muito menos se negavam a trabalhar e receber por um trabalho que feito de graça “serviu bem” ao Brasil por mais de 350 anos), tinha na realidade o “componente racial” como base (vide “Política nacional de branqueamento” : http://amazonida.orgfree.com/movimentoafro/branqueamento.htm), hoje muito mais que antes tenta-se dissimular que a a imigração de negros não é bem-vinda, mas ainda em pleno meados do século XX , isso era descaradamente colocado inclusive na LEI : vide Decreto-lei nº 7.967/1945. cuidando da política imigratória, dispôs que o ingresso de imigrantes dar-se-ia tendo em vista “a necessidade de preservar e desenvolver, na composição étnica da população, as características mais convenientes da sua ascendência européia.” (artigo 2º) .
Pouco conhecido fora do círculo dos estudiosos da temática é também o caso do Brazilian-American Colonization Syndicate, descrito por (Tiago de Melo Gomes) ” em 1921 manifestou seu desejo de adquirir terras no interior do Mato Grosso, visando colonizá-las com afro-americanos. Quando a notícia chegou aos ouvidos dos habitantes do “paraíso”(racial, grifo nosso) as reações foram instantâneas, e imediatamente os deputados Andrade Bezerra e Cincinato Braga apresentaram à Câmara dos Deputados um projeto impedindo “a importação de indivíduos de raças negras”. O projeto não se transformou em lei, mas isso não impediu o governo brasileiro de utilizar diversas artimanhas para negar vistos de entrada a afro-americanos, provocando com isso diversos protestos nos Estados Unidos.” , ou seja, o argumento de que toda “preocupação” e “reservas” à imigração massiva haitiana é meramente com as “consequências sociais” ou de priorização dos nacionais e regionais em situação de pobreza, não é plenamente verdadeiro…, há registros inequívocos na nossa história relacionada a imigrações, da faceta anti-negro; é portanto certo, que o velho e hipócrita META-RACISMO brasileiro também se faz presente na atual questão.
É isso aí. Tanto que foi o que perguntei ao Luiz Lauschner, quando escreveu e publicou (acho que no início de janeiro) um artigo sobre a questão da “invasão” (nas palavras dele) dos haitinos a Manaus, no EM TEMPO online: Por quê a contrariedade? Por quê são negros e vindos do país mais pobre das Américas?.