SEPPIR, para quê e até quando ?
Antes de mais nada, o presente não é “contra” a SEPPIR-Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, nem especificamente contra qualquer de seus integrantes ou dirigentes passados e presentes, mas sim uma reflexão sobre a sua função, seu estilo de atuação, sua “ligação” com os Movimentos Sociais de base e as suas chances de manutenção como “primeiro escalão” ou de sua absorção pela Secretaria Especial de Direitos Humanos.
Por definição da própria SEPPIR em seu site :
” A criação da Secretaria é o reconhecimento das lutas históricas do Movimento Negro Brasileiro. A missão da SEPPIR é estabelecer iniciativas contra as desigualdades raciais no País. Seus principais objetivos são:
· Promover a igualdade e a proteção dos direitos de indivíduos e grupos raciais e étnicos afetados pela discriminação e demais formas de intolerância, com ênfase na população negra;
· Acompanhar e coordenar políticas de diferentes ministérios e outros órgãos do Governo Brasileiro para a promoção da igualdade racial;
· Articular, promover e acompanhar a execução de diversos programas de cooperação com organismos públicos e privados, nacionais e internacionais;
· Promover e acompanhar o cumprimento de acordos e convenções internacionais assinados pelo Brasil, que digam respeito à promoção da igualdade e combate à discriminação racial ou étnica;
· Auxiliar o Ministério das Relações Exteriores nas políticas internacionais, no que se refere à aproximação de nações do Continente Africano; “
Olhando meramente para tais objetivos, é inegável que vários avanços foram realizados e a Secretaria teve em variados momentos atuação combativa e decisiva como na chamada das Conferencias Nacionais, na negociação para a aprovação do EIR (Estatuto da Igualdade Racial), nas audiências públicas sobre cotas no STF, em variados acordos institucionais intra-governamentais, internacionais , questão quilombola e até mesmo em casos recentes como a famosa propaganda da CEF com o Machado de Assis “branco”. Porém também teve atuação tímida ou nula em situações em que se esperava muito mais da Secretaria.
Já se vão oito anos desde a sua criação e ainda me pergunto o por quê ? da SEPPIR não ter trabalhado menos timidamente no emponderamento dos movimentos negros. Por qual motivo o fato de “ser governo” tem que promover um distanciamento tão grande das “ações de varejo” e combatividade dos tempos de militância de boa parte de seus integrantes? Chegando-se mesmo a criar antagonismos desnecessários e inesperados entre a “turma do governo” e variadas lideranças que estão completamente fora de tais instâncias (pelo menos no tocante à temática da igualdade racial, cultura negra, etc…).
Fica claro (pela própria definição oficial acima) que a Secretaria apesar de ter sido criada por demanda do Movimento Negro, possuir grande número de integrantes que vem da militância e dispor de alta capacidade de articulação entre as estruturas de poder. Porém não tem (nem nunca teve) a função de “devolver à base” em forma de apoio prático (nem ao menos tácito ) parte do “poder ” ao qual foi guindada, ou seja, sua missão é a “política de alto nível” , o fomento de políticas que de maneira geral beneficiem as populações tradicionalmente prejudicadas por viés “racial” (em especial a negra).
Faz tudo isso sem o fortalecimento dos movimentos (principalmente os não ligados diretamente a partidos políticos e grupos sindicais) e que tradicionalmente tem lutado por elas (não foi por acaso que os indígenas na I CONAPIR em 2005, demandaram a criação de uma Secretaria específica para seus interesses…, também não é por acaso que o movimento indígena é via de regra muito mais bem estruturado que o movimento negro e apoiado inclusive por organizações estrangeiras…) .
O “aparelhamento” direto e declarado dos movimentos de negritude ao invés de ser “rechaçado” e tergiversado, deveria ter sido desde sempre uma das metas principais da Secretaria… . Por muito tempo, sempre que solicitado um apoio ou atuação mais direta da SEPPIR (e não estamos nem falando de verba ou o que o valha) por lideranças e grupos locais do movimento (principalmente aqui no norte), via de regra as respostas e ações sempre foram evasivas ou negativas, do tipo “organizem-se” (leia-se “virem-se sozinhos”), “articulem-se localmente” ou “enquanto governo federal não podemos nos intrometer diretamente em questão local”. Fora as questões políticas e “impedimentos partidários” que “travaram” certos apoios que seriam de grande valia para a causa .
Tal “aparelhamento” do MN não conflitaria em nada com as premissas básicas da SEPPIR, e nem demandaria orçamento próprio (que todos sabemos ser minguadíssimo) mas pura e simplesmente a vontade de fazer e a articulação com outros orgãos com capacidade de execução… . Poderia ser feito através de FOMENTO à programas para a qualificação da militância (ex. cursos presenciais e principalmente a distância na temática em variados níveis, inclusive pós-graduação), FOMENTO à programas de facilitação da regularização de entidades do Movimento Negro (a grande maioria não tem nem pessoa jurídica ou sede) para atuarem como OSCIPs e com isso obterem a consequente possibilidade de captação de recursos e condições de estruturação física, etc…, emponderamento jurídico… .
Enfim, AJUDAR a transformar os Movimentos Negros “independentes” em bem equipadas “pontas de lança” para a luta pela igualdade e o combate ao racismo “no terreno” (de forma tática), enquanto à Secretaria caberiam as questões estratégicas e de “alto nível” .
Acontece que ao não ter aproveitado a oportunidade para garantir o emponderamento generalizado do Movimento Negro ( que estaria então interessado e capaz de manter a atuação nos níveis táticos locais e apoiar politicamente uma estrutura específica no nível estratégico e no primeiro escalão governamental), corre agora o risco de não ter o apoio generalizado e a força necessária para continuar existindo em primeiro nível… . O questionamento sobre a necessidade de se manter ou não uma SEPPIR nos moldes em que se manteve até hoje, não é mais caso isolado dentro do MN… .
Se hoje, dentro de um governo de “centro-esquerda” encabeçado pelo PT, corremos o risco de ver a importância e prioridade da questão afrobrasileira ser diluída e “subalternizada” dentro de uma estrutura governamental genérica de Direitos Humanos, imaginemos em uma não totalmente improvável reassunção de um governo de centro-direita… . Dai a importância estratégica de se ter uma capilarização da capacidade de enfrentamento, articulação política e governamental; um Conselho, uma Secretaria ou Ministério podem desaparecer ao sabor dos governos, um movimento forte e estruturado dificilmente… .
Por outro lado, fica a dúvida…, será que “encapsulada” dentro de uma estrutura em que o fato de “ser governo” tradicionalmente não retire tanto a ligação assumida com os movimentos sociais (valorizando e emponderando os mesmos ) e com o obvio forçamento a uma maior “diversidade” dentro das equipes temáticas. Não teríamos melhores, mais rápidos e efetivos resultados ? (vide o exemplo do MEC, que não mais cuidará da Educação Superior, que passará então a ser atribuição do MCT… tradicionalmente muito mais pragmático )
É claro que que todos que de alguma forma tem se engajado na luta pela plena igualdade da população afrobrasileira entendem a importância e desejam uma instância de primeiro escalão a tratar da questão. Porém a permanecer do jeito que já conhecemos, eu particularmente “pagaria para ver” como seria uma “SUB-SEPPIR” (talvez mais afinada com as bases…), de qualquer forma, Secretaria ou Sub algumas mudanças precisam vir .
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