29 de março de 2024
Não lembro de onde veio, mas sabia que a imagem ia ser útil um dia…   Não lembro de onde veio, mas sabia que a imagem ia ser útil um dia…

Nem preciso completar a frase…, a massa conscientizada já a conhece e concorda… .

No dia 04 de março, a Revista Veja lançou mais uma das suas “matérias especiais”, não vou dizer que a mesma se superou, pois em se tratando do veículo…, parece que a capacidade de gerar matérias totalmente alijadas das premissas jornalísticas ( principalmente o compromisso com a verdade, mesmo que satirizada ou questionada) aumenta a cada edição.

Com a estratégica proximidade da “batalha final” no Senado para a aprovação da lei que institui as cotas sociais e sócio-raciais nas universidades públicas, a revista aproveitou para lançar a matéria assinada por Camila Pereira sob o sugestivo título de “Uma segunda opinião” (como se em algum momento tivesse sido publicada pela revista  alguma “primeira opinião” em sentido contrário…) , o fato da opinião da revista ser “a segunda” pressupõe que haja uma primeira e diferente…, mas imparcialidade é uma palavra que parece  não constar na linha editorial da mesma , dai nunca se ter lido na revista com o mesmo destaque a “primeira opinião”.

Usando a “boa técnica” meta-racista, a matéria inicia “reconhecendo a justeza” de uma maior inclusão de “negros, pardos e índios” mas não deixa de apelar ao velho estratagema de não utilizar a nomeclatura oficial das políticas públicas ao usar NEGRO como sinônimo de PRETO, induzindo a uma idéia de dissociação entre pretos e pardos (que juntos formam a população NEGRA) na obvia tentativa de “reduzir” a população negra tão e quão somente aos pretos ( negros com “jeitão” padrão africano)… e com isso “justificar” outros pressupostos falaciosos, por ex.  que pardo não é negro… ou  que  a miscigenação é extrema…,  o que em tese “reduziria o peso populacional negro”  e  a extensão das desigualdades ( e de quebra demonstraria a “vocação nata” do Brasil para a Democracia Racial ).

Na sequência demonstra uma cínica “preocupação” com a forma como a lei chegou a Senado e com seus “possivelmente ruinosos” resultados para todos os brasileiros e principalmente para os supostos beneficiários.

Apela para “o papel” que se deseja para a universidade, dissociando descaradamente a possibilidade de se fazer reparação histórica e produzir conhecimento…

O “passeio” pela lógica anti-AA segue seu curso, agora afirmando que METADE das vagas será ocupada por estudantes que tem como passaporte a “cor”  usando o superado conceito de raça e não o mérito… (mentira A: a metade das vagas é para a escola pública não para negros (que tem dentro dessa uma sub-cota proporcional) , mentira B: fala em “raça” do ponto de vista biológico, quando o “racial” em questão é a secular construção social de raça) , “deduzindo” que com a entrada dos negros cotistas além do “mérito” é certo também o fim da “produção do conhecimento e o avanço acadêmico”.

Na “próxima estação”  o trem da lógica anti-AA , desqualifica e minimiza os resultados dos estudos realizados nas instituições que já aplicam AA e constataram enfáticamente que o rendimento  dos cotistas tem sido o mesmo dos não-cotistas (com tendência a ser até melhor na média), portanto  não “baixando o nível” nem outros “catastrofismos” vaticinados pelos anti-AA.

Nas próximas duas páginas a matéria desfia o  tradicional “rosário de argumentos falaciosos anti-cota ” ( a nota de entrada é muito menor…, vão entrar mas não vão acompanhar, o ódio racial vai se espalhar, nos EUA as cotas são inconstitucionais,  no Brasil nunca houve segregação,  usar critérios “raciais” mesmo que afirmativos é “racismo” (sic) e por ai vai…) , a novidade fica por conta de uma muito bem produzida montagem fotográfica com os seis  ”negros e mestiços” (por incrível que pareça o “ícone” da causa mestiça, não aparece…) de “movimentos idem”  que não concordam com cotas, AA, nem nada que faça menção a questões raciais…, exceto o culto à miscigenação ([pasmo ON] o difícil é entender para que servem “movimentos negros individuais” que não reivindicam nada de útil para a negritude e ainda se aliam aos adversários das reivindicações…,  não sei porque… agora me lembrei das aulas de direito e de uma tal de falsidade ideológica… [pasmo OFF] )   dos seis , três eu conheço pessoalmente (e por  completa falta de hipocrisia não posso dizer que tive o prazer de ),  aqui pelo menos uma conclusão eu posso adiantar, os fotógrafos da Veja são mesmo “porretas” e esse tal de Photoshop faz milagres… 🙂 .

Mas a coisa vai mais longe…, em mais 4 páginas (isso mesmo) , se juntam “reflexões” sobre ‘”nazismo”, “tribunais raciais”, o requentadíssimo caso dos “gêmeos da UNB”, uma estranha dúvida sobre o direito de negros descendente de negros que tiveram escravos (como se isso tivesse sido situação comum e como se tal fato tivesse o condão de anular a dívida histórica do estado brasileiro pelos 350 anos de escravidão negra fomentada e oficializada por  ele, bem como seus efeitos para a virtual totalidade da população escrava e liberta e de todos seus  descendentes até os atuais e próximas gerações).

Perto do fim, a matéria  ”apela” pelos “brancos pobres” e lança a dúvida sobre uma brecha que permitiria aos negros ocupar “todas as vagas da cota” (como se não houvesse uma outra metade das vagas totalmente livre de reservas e como se a escola pública fosse majoritariamente ocupada por negros com melhores condições sociais que os brancos da mesma ) ; falácia tem perna curta e  apenas para constar :  Cotas, Bônus e ProUni  a partir de 2004, somados  já incluíram mais de 400.000 estudantes no ES (faltam os dados de 2009), sendo cerca de 192.000 afro-descendentes (pretos e pardos) , mais de 1.500 indígenas  e  cerca de 206.000 “brancos” carentes …  , não precisa ser expert em estatística para ver que apesar da inclusão de afrodescendentes ter sido maior nesse periodo que em todo um século, em números absolutos e relativos ainda foram os “brancos carentes” os principais beneficiados (e que sem o recorte racial , os “brancos carentes”  da escola pública, majoritariamente em melhores condiçoes sócio-econômicas  que os negros da mesma situação ficariam com praticamente todas as vagas da AA) .

Quase arrematando, a matéria apresenta a foto de uma manifestação de negros (com a presença do único senador negro da república)  não sem alertar que  o discurso negro  ”segrega ao invés de unir” e ai  recorre ao velho argumento do “O problema é a educaçao básica” , tentando em vão manter algum fio de imparcialidade, “disfarça” colocando um gráfico com apenas 4 argumentos pró-cotas ( rebatidos imediatamente  no mesmo gráfico e com o dobro de espaço), clama pela “meritocracia” e publica a foto de um “pobre rapaz branco gaúcho” (note bem eu disse “pobre rapaz” , não rapaz pobre…) que “perdeu” a vaga na UFRGS para um cotista (não se sabe se branco ou negro) depois de “estudar muito”…;  aqui deduzo que se o rapaz não é negro nem concorreu como cotista pela escola pública , é porque é um “branco ‘rico’ oriundo da particular”, como ele não concorreu pelas cotas não ” perdeu vaga”  para nenhum cotista ( já que as vagas são distintintas e a classificação idem) , ele  ”perdeu”  a vaga foi para um outro estudante de semelhantes condições e oportunidades mas que realmente “estudou mais” ….

O “grand finale” fica pela absurda constatação que para preencher todas as vagas as universidades precisarão aprovar candidatos com notas baixas (como se a diferença entre as notas de  cotistas e não-cotistas fosse tão grande…, e não é , mas é o suficiente para desclassificar…, um branco rico de escola particular tira 7,5 e um outro branco da escola pública tira 7,0 e um negro da mesma escola tira 6,5, a diferença é pequena apesar das condições de desigualdade competitiva prévia, mas em um concurso universal o branco e o negro pobre estariam fora, pelas cotas os dois entrariam e o branco rico teria que fazer valer sua vantagem e aumentar seu “mérito”  em  meio ponto se não quisesse perder a vaga para seus colegas de escola…) .

Uma “desqualificada básica” no uso de cotas pelo mundo, fechando com “chave de ouro”  com uma foto em preto e branco das entradas segregadas dos EUA doa anos 50 e “providencialmente” lembrando que isso nunca existiu aqui…

Decididamente, entre o capuz e a “cara-de-pau deslavada”,  está confirmado,  a “mídia-má” optou pela segunda…, se a crise global não aumentar demais o preço do óleo de peróba , continuaremos nos divertido comentando esse tipo de anti-jornalismo.

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